quarta-feira, 19 de outubro de 2011

PENAFIELGATE: Cheque, Mentiras e Escândalo na Arbitragem

Na tarde de 10 de Novembro de 1990 rebentou a “bomba”, em Penafiel. Nomeado para arbitrar o encontro entre Penafiel e Belenenses, Francisco Silva não entrou em campo. Quem apareceu para arbitrar o jogo foi outro juiz: Fortunato Azevedo, de Braga! Rapidamente se espalhou a notícia de um escândalo que envolvia diversos agentes desportivos. Ressaltava Francisco Silva como o receptor de um alegado cheque de 2000 contos – o ex árbitro garante: “não houve cheque nenhum” –, alegadamente entregue pelo presidente dos donos da casa, Manuel Rocha, para pagamento de ‘favores’. Lourenço Pinto, ao tempo presidente do Conselho de Arbitragem, assumiu-se como o, alegado, ‘descobridor’ da tramóia, aparecendo na cabina dos árbitros a pedir que Xico Silva lhe entregasse a prova do ‘crime (o cheque)!

Primeiro na cabina dos árbitros

Mas afinal o que aconteceu. João Batista repórter presente no jogo, entrou na cabina com a equipa de arbitragem para fazer um pedido logístico. “ Na cabina não vi nada. Nada de nervosismo da parte de Francisco Silva e dos seus companheiros [Arménio Estorninho e António Pincho]. O que eu vi foi o árbitro Fortunato Azevedo chegar ainda antes de Francisco Silva. Vinha num Mercedes que estava cheio de gente, e estacionou a viatura perto das cabinas do estádio. Reparei ainda que o presidente do Penafiel [Manuel Rocha] andava no corredor junto às cabinas, visivelmente agitado

Alegadamente, terá sido Manuel Rocha a avisar Lourenço Pinto de um pedido de Francisco Silva. O presidente dos árbitros avisado montou a operação ‘caça ao cheque’.

“Foi tudo tão rápido que fiquei sem perceber nada. Lourenço Pinto pediu-me um cheque! Não lhe dei nada porque não havia qualquer cheque” disse Francisco Silva.

Francisco Silva foi ao programa, da SIC, Máquina da Verdade. Negou tudo. A máquina desmentiu-o.

A Versão de Fortunato

“Do que se passou na cabina não digo nada. Vai ficar comigo e com Deus, para sempre”, conta Fortunato Azevedo, o árbitro substituto. No entanto adianta: “Já depois do jogo, o Xico estava à minha espera junto à minha casa e eu só lhe disse: ‘Não é que tu mereças pelo mal que fizeste à arbitragem, mas vai descansado que eu não vou dizer a ninguém o que vi’.”

O ex. árbitro internacional, conta ainda que foi apanhado de surpresa. “ Foi o momento mais triste da minha vida. Se soubesse ao que ia não tinha aceitado. Fui procurado, em casa, por Lourenço Pinto e José Passos Rodrigues, presidente do Conselho de Arbitragem da AFBraga, horas antes do jogo. “Disseram-me que tinha havido algo de grave com o Francisco Silva – pensei que tinha tido um acidente – em Penafiel e que eu já não ia fazer o Varzim – Académica no dia seguinte. Tinha de arbitrar o Penafiel – Belenenses. Metemo-nos no carro do senhor Passos, um Mercedes, e lá fomos para Penafiel.”

“Lourenço Pinto e Manuel Rocha foram os autores da trama”, de acordo com declarações de Francisco Silva logo a seguir ao acontecimento. Oficialmente, o antigo árbitro foi irradiado e por isso obrigado a deixar prematuramente “aquilo que mais gostava de fazer.” E queixa-se: “Se tivesse sido Pinto de Sousa (antigo presidente da arbitragem) o assunto era tratado de outra forma. Lourenço Pinto foi ‘levado’ e também se tramou!”

Lourenço Pinto Também Teve de Sair

Estava-se no pleno dos chamados “quinhentinhos”, onde era público e notório um esquema de troca de favores que passava por um bar do Porto, que pertencia a um conhecido dirigente portista, e ainda por um hotel onde muitos árbitros, alegadamente, passavam para um importante ‘beija mão papal’!
Perante o caso Francisco Silva, o então presidente do Conselho de Arbitragem, Lourenço Pinto, acabou, tal como Francisco Silva, por não resistir à situação criada. Foi obrigado a demitir-se do cargo de responsável pela arbitragem, sendo substituído por Fernando Marques, o homem que havia de introduzir o sorteio semanal dos árbitros. Lourenço Pinto – não presta declarações sobre o assunto – manteve sempre uma estreita ligação a Pinto da Costa e é hoje o actual Presidente da Associação de Futebol do Porto.

PROTAGONISTAS

O Isco

Francisco Silva está hoje reformado e confrontado com o passado diz “não quero falar mais disso.” Reconhece, no entanto: “Servi de isco para outros salvarem a face”, acentuando, ” eu era pequenino e contra a força não há argumentos”.

O Cordeiro e o Rebanho



Gaspar Ramos, ao tempo homem forte do futebol do Benfica, não tem dúvidas em classificar o caso Francisco Silva: “Foi o sacrificar de um ‘cordeiro’ para salvar os ‘donos do rebanho’.”


Ninguém o Quis Ouvir

“Apesar de eu ter sido referenciado nos jornais como tendo estado na cabina do árbitro antes do jogo, nunca fui chamado para depor em lado nenhum”, confessa João Batista, repórter presente em Penafiel.

Dei Explicações ao ‘Xico’

Fortunato Azevedo diz não saber ao que ia e por isso afirma: “ Não deixei de dizer ao ‘Xico’ Silva que eu não tive nada a ver com o que se passou na cabina. Apenas estava ali para arbitrar, como me pediram.”

Governo legisla contra corrupção desportiva

Perante o caso Francisco Silva a justiça teve dificuldades porque a legislação contra a corrupção não contemplava a actividade desportiva. Foi tempo de o governo, liderado por Cavaco Silva, o fazer. Guímaro já não se safou.

Futebol, Só Com o Neto

Francisco Silva diz que já deixou de frequentar campos de futebol. Apenas faz uma excepção: “ vou ver o meu neto, José Miguel, que joga nos juniores do Portimonense depois de ter passado pelos juvenis do FCPorto”.

Carlos Severino