Moniz Pereira tem quase 90 anos e está com um problema de saúde que espero seja apenas passageiro. É que afinal ele sempre pareceu de ferro, pela persistência e pela teimosia com que sempre defendeu as suas teses. Os resultados são mais que conhecidos. Tudo em benefício do Sporting e de Portugal. Por ter o privilégio de conhecer o Prof. e com ele ter convivido em diversas situações, aqui partilho algumas "estórias".
O PROF. E O CORO
Recuo a 1969 para recordar a primeira vez que estive pessoalmente com Moniz Pereira. Não, não foi no atletismo ou em qualquer situação desportiva. Foi num acampamento, em Santo António dos Cavaleiros, onde eu e mais uns quantos jovens, que compunham um grupo coral, fomos dirigidos por Moniz Pereira, numa noite de Outubro, iluminados por uma enorme fogueira. Foi uma noite marcante, onde as nossa vozes ecoaram afinadas e comandadas por um maestro de luxo.
A CONVICÇÃO DE UM HOMEM
Em 1972, o atleta Carlos Lopes dava nas vistas em Portugal. Ainda antes dos Jogos Olímpicos de Munique, vi Moniz Pereira, na televisão, a dizer que os atletas portugueses eram tão bons como os melhores, precisando apenas ter condições de trabalho para atingirem grandes marcas. Confesso que na altura fiquei impressionado com a certeza com que MP disse aquilo. Veio a provar-se poucos anos depois com Carlos Lopes a conquistar Prata nos JO de Montereal. Depois foi o que se sabe.
Em resultado de tudo o que aconteceu, em 76 fui fazer atletismo no Sporting. O meu treinador era o saudoso Manuel Faria que fazia parte da equipa técnica de Moniz Pereira. Nessa altura ficava ali fascinado a ver MP a dar treino a Carlos Lopes e Fernando Mamede, entre outros, na velhinha pista de cinza.
O SENHOR ATLETISMO E O JORNALISTA
Como jornalista entrevistei algumas vezes o Prof. Normalmente falávamos de futebol, em momentos menos bons do Sporting, onde ele recordava o tempo em que foi preparador físico da equipa, mais concretamente da que venceu o Campeonato em 1970, treinada por Fernando Vaz. Moníz Pereira falava, com um brilhozinho nos olhos, da simplicidade de métodos e dos resultados obtidos em contraponto com resultados menos conseguidos noutras alturas.
O AMOR AO SPORTING E AO ATLETISMO
Moniz Pereira é um homem com os sentimentos à flor da pele. Quando fala de algo marcante não consegue evitar as lágrimas. Foi assim que, já no Sporting, presenciei vários momentos, em diversos eventos, onde a presença do Prof. enchia-nos de orgulho por haver alguém como ele no nosso Clube.
Mesmo de provecta idade, Moniz Pereira nunca deixou de lutar para que o atletismo do Sporting fosse uma grande referência do Clube. Mesmo com muitas dificuldades, nunca sucumbiu ao desânimo das contrariedades. Lembro-me bem de numa época, ainda com Dias da Cunha como Presidente, MP ter recebido a notícia de um corte na verba para o atletismo que colocava em causa a qualidade da equipa. Pois bem, o Prof. foi à luta criando os "Amigos do Atletismo" e acabou por superar as dificuldades financeiras conseguindo manter os melhores atletas.
UM PROBLEMA NOS JOGOS DE 2000
Para terminar estas referências a Mário Moniz Pereira, assinalo uma conversa que tivemos pouco antes dos Jogos de Sidney, em 2000. Passei pelo gabinete do Prof. para o cumprimentar e verifiquei que estava com um ar preocupado. Como não era hábito, não pude deixar de lhe perguntar a que se devia a sua preocupação. Respondeu-me dizendo que a sua ida aos JO estava em risco! Perguntei-lhe porquê, se tinha algum problema. Ele que tinha quase 80 anos na altura, disse-me que a sua mãe estava doente! Confesso que fiquei surpreendido porque nem sequer imaginava que a senhora era viva. Mas era. Tinha cerca de 100 anos.
NOTA FINAL
Espero eu e todos nós, por certo, que Mário Moniz Pereira regresse brevemente a sua casa e ao Sporting. Um homem com a têmpera do Prof. vai, com toda a certeza, ultrapassar mais esta barreira, ele era e é "especialista". Todos estaremos cá para o receber de braços abertos e dizer-lhe, mais uma vez, nunca é demais, obrigado pelo que fez pelo Sporting e por Portugal.
Carlos Severino