quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

CRISES NO SPORTING 3 - O SISTEMA

Há muitos anos que os dirigentes que passaram pelo Sporting, por inépcia, por falta de conhecimento ou outra ordem, deixaram que o clube ficasse enredado por uma teia que o tem arrastado para níveis nada condizentes com a sua dimensão feita de muitas e importantes conquistas. Mas houve uma tentativa para libertar o Sporting dessa teia que o sufoca cada vez mais.






ATAQUE AO SISTEMA

Em 2000, após a conquista do Campeonato que fugia desde 1982, o relacionamento interno entre os dirigentes da altura era tão mau que até parecia que a grande vitória pertencia a uns quantos e o resto só estorvava. O Presidente, José Roquete, demitiu-se alegando uma incompatibilidade pública e notória com o presidente da SAD, Luís Duque, com ele levando cerca de 200 mil acções que vendeu com o preço em alta.

A pasta passou para Dias da Cunha, que herdou uma mão cheia de nada para construir o Estádio e pagar os altos salários e prémios de assinatura do camião de jogadores contratados por Luís Duque.

Como neófito nas andanças do mundo da bola, DC teve a humildade de solicitar que o enquadrasse na realidade e lhe explicasse como tudo funcionava porque queria um Sporting a liderar a credibilização do futebol.

O PRIMEIRO COMBATE

Eu estava de alma e coração no Sporting, meu clube de sempre, e tudo faria para o ajudar a afirmar-se sem qualquer subalternidade. Ao desafio de Dias da Cunha respondi oferecendo-lhe o livro de Marinho Neves, Golpe de Estádio, devidamente legendado, dizendo-lhe que estava ali retratado o chamado sistema que controlava o futebol português.

Dias da Cunha aprendeu depressa, exigindo sempre provas concretas para poder dizer de sua justiça sem ser desmentido. Foi neste contexto que foi contratada, por minha indicação, a colaboração de Marinho Neves. Com relatórios sempre que se justificava, Marinho Neves fornecia informações tão preciosas que a relação durou até Dias da Cunha sair. Não durou mais porque a primeira preocupação dos sucessores, DC partilhava os documentos com eles, foi a de dispensar os serviços de Neves com a alegação, foi-me transmitido por Rui Meireles, um homem de grande confiança de Dias da Cunha, quem diria, de que não se reviam naquele combate do ex. Presidente.

Dias da Cunha começou a falar do sistema em programas televisivos, no final de jogos e sempre que sentia que o devia fazer. Foi num jogo com o Beira-Mar, em Aveiro, que utilizou pela primeira vez a palavra que mais o identifica na passagem pelo futebol. O Sporting venceu por 1-0, mas a arbitragem de José Leirós foi tão esquisita que DC, no final da partida, não se coibiu de dizer: "temo que o sistema esteja de volta."

O primeiro impacto das polémicas declarações de Dias da Cunha levaram figuras, alegadamente tidas como do sistema, a denegrir-lhe a imagem. Lembro-me de reacções intempestivas de Valentim Loureiro e de Guilherme Aguiar que se lhe referiu como: "negreiro", numa clara alusão ao facto de DC ser de Moçambique. Dias da Cunha respondeu dizendo que até nasceu como português de 2ª classe. Mas o problema maior foi a crítica interna. Houve até quem achasse que Dias da Cunha devia parar porque estava a ser "motivo de chacota nacional!"
REGENERAR COM PINTO DA COSTA

Com a noção de que era difícil arrastar para a sua luta os dirigentes de outros clubes, Dias da Cunha viu em Pinto da Costa a pessoa ideal para levar os seus intentos a bom porto. Primeiro porque a PC ninguém, ou quase, dizia que não. Depois porque o Presidente portista já tinha ganho tudo e era uma boa oportunidade de se livrar de alguns rótulos por alegados métodos menos convencionais para chegar ao êxito.


O FRANKENSTEIN

Foi num almoço de direcções, a anteceder um Sporting - Porto, em 2001/2002, que Dias da Cunha se dirigiu a Pinto da Costa. Olhando-o nos olhos, disse: "Sr. presidente, eu não identifico o sistema com o FC Porto. O sistema é hoje um Frankenstein que já fugiu ao criador". Pinto da Costa ruborizou, mas respondeu dizendo que nos anos 80 os Presidentes dos clubes se juntavam e falavam olhos nos olhos e que veria com muito interesse que isso voltasse a acontecer. Assim nasceu o Movimento dos Presidentes. O curioso é que terminado o almoço Pinto da Costa quando interpelado pelos jornalistas não deixou de os informar que Dias da Cunha, afinal, não conotava o FCP com o sistema.

O Movimento dos Presidentes havia de juntar todos os clubes da Liga por 3 vezes, tendo terminado por causa das saídas de Benfica e Boavista.




O relacionamento de Dias da Cunha com Pinto da Costa mereceu muitas críticas, especialmente internas. Durou um punhado de meses nessa época de 2001/02. Acabou pela solidariedade de DC para com Soares Franco que tinha dito numa alusão menos conseguida: "o Papa está morrer, os papas também morrem." Pinto da Costa respondeu, no jornal Público, dizendo que: "depois de almoço não se podia levar FSF a sério."

Ainda hoje há muita gente a dizer que Dias da Cunha foi "levado" por Pinto da Costa. Os factos desmentem isso. Na época do bom relacionamento entre os dois Presidentes, foi o Sporting que conquistou o título de Campeão, venceu a Taça de Portugal e a Super-Taça.




Continua...

Carlos Severino